quinta-feira, 5 de março de 2015

WHO RUN THE WORLD? (parte 2 - por Patrícia Angélica)


Na parte 2 da nossa série especial em homenagem à Semana da Mulher, Patrícia Angélica conta porque a natação brasileira feminina ainda está longe do patamar de grandes potências, como a norte-americana, europeia e, especialmente, a australiana, com a ajuda de especialistas da natação, como o Coach Alexandre Pussieldi e Arilson Soares:

A natação brasileira começou a se destacar no cenário nacional na década de 1930 com duas mulheres: Maria Lenk, primeira mulher latino-americana a participar de Jogos Olímpicos em Los Angeles-1932 e ex-recordista das provas de 200m e 400m peito (esta última já não existe mais); e Piedade Coutinho, dona do melhor resultado de uma mulher brasileira em Jogos Olímpicos, o quinto lugar nos 400m livre em Berlim-1936. Depois delas, poucas brasileiras mereceram destaque semelhante em águas internacionais. Patricia Amorim, por exemplo, não passou do 11º lugar com o revezamento 4x100m livre nos Jogos Olimpicos de Seul, na Coréia do Sul, em 1988. Para encontrar nadadoras se destacando em nível olímpico, saltamos do ano de 1948 e vamos para o ano de 2004. Um gap de nada mais, nada menos do que 56 anos. Na edição de 2004, quando o COI trouxe os Jogos para Atenas, cidade onde os Jogos nasceram na Antiguidade e ressurgiram na Era Moderna, em 1894, o Brasil teve cinco atletas presentes em três finais olímpicas. As estrelas desse salto de qualidade foram Flávia Delaroli (8º nos 50m livre), Joanna Maranhão (5º lugar nos 400m medley e 7º com o revezamento 4x200m livre), Mariana Brochado, Monique Ferreira e Paula Baracho (as três no mesmo revezamento que Joanna). A partir daí a natação feminina foi-se aprimorando, mas ainda está longe de atingir o mesmo nível internacional que temos no masculino, com recordes mundiais, campeãs mundiais de piscina longa e curta (N.E.: muito embora já tenhamos uma recordista e campeã, Etiene Medeiros), e medalhistas olímpicas.
E a pergunta que nunca se cala é... por quê?
Especialistas e treinadores atribuem o desempenho tímido a um problema histórico-cultural. "As mulheres tiveram que vencer uma série de barreiras até aparecer no cenário nacional", argumenta o supervisor técnico da natação na CBDA, Ricardo de Moura, em entrevista realizada durante o Troféu Maria Lenk, na última semana de abril de 2013.
Que barreiras são essas? Uma delas diz respeito à força física. A natação é um esporte que demanda explosão e força, daí a necessidade de muito trabalho de musculação. Fabiola Molina observa, em conversa durante a competição, que sempre houve um mito de que a natação deixava a mulher forte e masculina. "As pessoas ainda acham que mulher nadadora tem as costas largas. Algumas nadadoras se recusavam há alguns anos a fazer exercícios fora d'água justamente por medo de ficar com aparência masculinizada, o que não acontece com tanta frequência quanto se imagina". No entanto, esses problemas não estão apenas nas atletas e no trabalho dentro ou fora das piscinas. Muitos problemas são também creditados aos próprios treinadores, à estrutura e à falta de apoio institucional.
O treinador Alexandre Pussieldi, técnico em Fort Lauderdale (EUA) (N.E.: recentemente ele voltou a morar no Brasil) e comentarista da SporTV, em bate-papo também no Troféu Maria Lenk, acredita que "está faltando um trabalho um pouco mais profundo, mais duro até. Eu acho que as meninas não estão treinando o suficiente. Não acho que as mulheres do Brasil sejam piores do as de qualquer outro lugar. Apenas a mentalidade de treinamento não é adequada às condições pra se competir internacionalmente".
Na visão de Arilson Soares, ex-treinador do Esporte Clube Pinheiros, hoje no ADN Natação, da Itália (N.E.: atualmente técnico de Cesar Cielo no Minas), treinar mulheres exige uma atenção especial com a parte biológica e hormonal. "O controle hormonal para as mulheres é muito mais difícil. Às vezes elas estão em um pico de força e conseguem uma boa intensidade de treino. Em outros momentos isso se inverte e elas começam a ficar um pouco 'femininas' demais, o que não é bom pra quem quer fazer um esporte de alto rendimento". Confirmando essa ideia, João Reinaldo, técnico de Joanna Maranhão, diz que o principal segredo para se treinar meninas é uma atenção psicológica especial: "A maneira de tratar, de acompanhar o treinamento, o modo de falar e até de cobrar fazem a diferença em um treinamento dado a uma garota na natação."
A ex-treinadora Rosane Carneiro, hoje profissional de gestão de marketing esportivo, já teve Joanna Maranhão (na foto desta matéria) como pupila. Ela não vê luz no fim do túnel a curto e médio prazos: "Joanna pode nadar até 40 anos (hoje a atleta tem 26) que ainda vai fazer o feijão com arroz dela no Brasil". E as provas dos campeonatos brasileiros comprovam isso. Joanna faz tempos na casa dos 4min40s nos 400m medley há nove anos e continua ganhando das adversárias com quase meia piscina de vantagem. O recorde brasileiro desta prova, desde os Jogos Olímpicos de 2004, é de 4min40s00 e pertence a Joanna Maranhão é de 4:40.00, enquanto o recorde mundial da é de 4min28s32 batido pela chinesa Shiwen Ye, de 16 anos, nos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012. Como mudar todos esses fatores que parecem tão arraigados na nossa cultura e história aquáticas?

Confira amanhã, na parte 3, a opinião dos especialistas para a melhora da natação feminina.

(Patrícia Angélica é jornalista, responsável pelos blogs Loucos Por Natação e Criminal Minds BR

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